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Segunda-feira, 26 de abril de 2021

O negacionismo em relação ao clima e à ciência somado ao autoritarismo em seu DNA tem como resultante a tentativa de neutralizar as universidades

O PortalAdverso nesta quarta entrevista da Série Autonomia Universitária conversou como o cientista político e professor titular do Departamento de Ciência Política e do Programa de Pós-Graduação em Políticas Públicas da UFRGS, André Marenco. Para André a autonomia se justifica como forma de garantir que universidades sejam dirigidas pela ciência e produtoras de ciência. “É preciso assumir que nos omitimos, nos últimos 20 anos, em discutir e apresentar para a sociedade e o Congresso, um projeto para regulamentar a escolha de dirigentes universitários’, afirmou. 
Leia a opinião do professor sobre o tema.


Portal Adverso: Porque democracias liberais e a Constituição Federal de 1988 consagram o princípio da autonomia universitária?
Para afirmá-las como instituições de Estado, protegidas contra os ciclos eleitorais e caprichos governamentais. Para que universidades possam cumprir sua vocação de produzir conhecimento e formar recursos humanos. A produção de conhecimento exige investimentos cuja maturação e retorno ocorrem a longo prazo. Em contraste mercados e governos operam frequentemente buscando retornos (econômicos, políticos) de curto prazo. Por outro lado, o credo democrático pressupõe que todas as opiniões têm o mesmo valor. Na ciência isto nem sempre ocorre: a defesa da cloroquina, de tratamento precoce, do isolamento social ou de vacinas não tem o mesmo valor, não se trata de votar qual o melhor procedimento, mas de cobrar as evidências que reforcem uma ou outra alternativa. Autonomia se justifica como forma de garantir que universidades sejam dirigidas pela ciência e produtoras de ciência.

Portal Adverso: Qual sua visão sobre o processo de escolha dos reitores de universidades e o respeito à lista tríplice?
É preciso assumir que nos omitimos -nos últimos 20 anos- em discutir e apresentar para a sociedade e o Congresso, um projeto para regulamentar a escolha de dirigentes universitários. Talvez tenhamos nos acomodado após governos que respeitavam a ordem nas listas tríplices. Também falhamos quando não fomos capazes de negociar e indicar três nomes que representem o compromisso majoritário da comunidade acadêmica com a ciência. É preciso assumir que falhamos, na UFRGS, quando abrimos espaço para um nome extremamente minoritário nos três segmentos. 
Portal Adverso: Por que acredita que estão sendo feitas nomeações, que nem sempre respeitam a escolha da maioria?
O governo Bolsonaro tem claramente uma vocação antissistema: contra a democracia, contra os partidos, contra o judiciário, o meio-ambiente e suas organizações de defesa, contra os movimentos sociais, a imprensa, a cultura, a ciência, as universidades. Enfim, tudo aquilo que constitui as democracias representativas, materializada no Brasil pela Constituição de 1988. O negacionismo em relação ao clima e à ciência somado ao autoritarismo em seu DNA tem como resultante a tentativa de neutralizar as universidades, focos de conhecimento científico e inconformismo político.
Mais surpreendente do que Bolsonaro intervir nas universidades federais é o fato de professores universitários aceitarem este papel, colocando suas carreiras em descrédito. O que farão daqui a pouco mais de 18 meses quando este governo tiver sido derrotado e começar a responder nos tribunais por seus crimes?

Leia as entrevistas anteriores.

Felipe Comunello.

João Carlos Salles.

Renato Oliveira.

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